Por: André | 26 Março 2012
Entre os filósofos que colocaram a ênfase na morte de Deus costuma citar-se, sobretudo, Nietzsche e também Hegel. Não tiveram uma ideia original. Já estava na lógica da tradição luterana, assim como na de Santo Agostinho e São Paulo. Junto com Hegel, foi este último que sublinhou, no entanto, que a morte de Deus em Jesus era um aspecto inevitável da humanidade de Deus. Respaldou sua afirmação apelando ao grito de “Deus mesmo está morto” procedente de um hino luterano, tão clássico que J. S. Bach o harmonizou e Brahms o converteu em tema de um prelúdio para órgão: O Traurigkeit, O Herzeleid (Oh tristeza! Oh pena do coração!). Nietzsche, simplesmente, inverteu a lógica da tradição paulina porque considerava que, com a peripécia de Cristo no calvário, Deus não apenas estava no banco, mas que havia sido condenado e executado.
A reportagem é de Juan G. Bedoya e está publicada no jornal espanhol El País, 23-03-2012. A tradução é do Cepat.
Isto entre filósofos. Para os teólogos, a questão é mais dramática. A teologia é uma linguagem sobre Deus (um logos sobre theos), assim que não há nada mais raro do que ver um teólogo dizer que Deus está morto, que nunca existiu, ou que ele não o encontra. Naturalmente, se o teólogo está comprometido com o ser humano neste mundo, o problema é de fundo também para os crentes. Trata-se do debate sobre a incompatibilidade de dois atributos de Deus, de seu deus: o da bondade e o da onipotência. A questão foi colocada primeiro por Epicuro, em uma formulação que sempre angustia os estudantes da disciplina que Leibniz batizou de teodiceia: Deus, diante do mal, ou quer eliminá-lo, mas não pode; ou não quer; ou não pode e não quer, ou pode e também quer. No primeiro caso, Deus não seria onipotente, no segundo não seria bondoso ou moralmente perfeito, no terceiro não seria nem onipotente nem bondoso ou moralmente perfeito, e no quarto Epicuro coloca a pergunta acerca de qual é a origem dos males e porque Deus não os elimina. Voltaire se perguntou a mesma coisa após o terremoto que destruiu Lisboa em 1755, e desde então não paramos de perguntá-lo aos teólogos diante de tanta tragédia.
William Hamilton (Evanston, Illinois, 1924) foi um dos teólogos com respostas contundentes, desde o polêmico movimento da teologia da morte de Deus, do qual foi um destacado representante (junto com Thomas Altizer, Paul van Buren e Gabriel Vahanian). Com o primeiro assinou um livro de sucesso: Teologia radical e a morte de Deus, em 1966. Quatro anos antes havia publicado sozinho A nova essência do cristianismo, obra também traduzida logo para o castelhano, primeira de uma dezena de obras filosóficas ou teológicas. Hamilton morreu no dia 13 passado em Portland (Oregon). Tinha 87 anos.
Um famoso artigo de capa na Time Magazine, publicado há mais de quatro décadas, dá uma ideia da difusão deste movimento. Hamilton conta que se fez a pergunta de Epicuro quando dois amigos seus – um episcopaliano e um católico – morreram em uma explosão de bomba, tanto assim que um terceiro – que era ateu – ficou ileso. Perguntou-se porque os inocentes sofrem e se Deus intervém nas vidas das pessoas. Respondeu: “Dizer que Deus morreu é dizer que deixou de existir como ser transcendental e se tornou imanente ao mundo. As explicações não teístas substituíram as teístas. É uma tendência irreversível; é preciso fazer-se a ideia da morte histórico-cultural de Deus. É preciso aceitar que Deus se foi e considerar o mundo secular como normativo intelectualmente e bom eticamente”.
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William Hamilton, o teólogo da morte de Deus - Instituto Humanitas Unisinos - IHU